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A minha visão sobre Educação. As várias visões sobre Educação e todas as suas (e nossas) variáveis.
Tinha ido jantar com uma amiga ao café Austríaco no Chiado e, como habitual nas nossas conversas, falámos sobre relações, o panorama político atual com a eleição de novos deputados, as políticas sociais (no nosso caso por defeito de profissão) que estão em vigor e qual o impacto na nossa sociedade. Falámos dos perigos dos extremismos, dos últimos gritos da vida política, dos rótulos, dos statements, de políticas. Indignámo-nos com algumas situações e rimos com outras.
Recordo-me que em alguns momentos da nossa conversa, sempre que nos queríamos soltar de preocupações com as palavras e amarras, olhávamos primeiro em redor para ver quem estava ao nosso lado (numa quarta feira à noite havia pouca gente) e esgueirávamo-nos ligeiramente para falar baixinho como se uma determinada espécie de PIDE estivesse à espreita. Tinha de dar mil voltas à cabeça para fintar os nomes e as expressões que podia utilizar, porque não posso chamar pelo nome, mesmo que chamando pelo nome na minha cabeça não soe a desrespeito ou intolerância. Palavras que são hoje rapidamente e facilmente passíveis de serem julgadas em praça pública. Rótulos que são imediatamente associados a xenofobia, intolerância, radicalismo, conservadorismo, machismo, feminismo, extreminsmo, fundamentalismo e todos os "ismos" que se tornaram os bodes expiatórios (sempre os outros, nunca eu) deste tempo. Nunca se colecionou tantos rótulos e gavetas como a atualidade que vivemos. Assemelha-se por vezes a uma caça às bruxas como no tempo da Inquisição, usando por vezes, raciocínios pobres non sense equiparáveis aos usados no icónico filme dos Monty Python “The quest for the holy grail”.
Sinto igualmente o cuidado de escolher a quem mando piadas, que é apenas isso mesmo, uma piada, por poder colocar algo em causa e ser julgada com uma moral que parece pretender ser superior. Mesmo que nos conheçam, mesmo que o nosso percurso tenha sido marcado por tudo menos os "ismos" - os rótulos que nos querem colocar (bem pelo contrário). De repente parece que o peso da atualidade e de normas que se mostram apertadas, escrutinadas e redundantes colocam em causa pessoas e percursos. Parece ter-se instalado uma determinada moda de estar e pensar que não permite uma autorreflexão.
São os arautos da moral, os ditadores dos bons costumes, deste e de outros séculos. Os mártires de ideologias que nunca se colocam em causa e mais grave, que não possuem um background que lhes permita fundamentar e refletir o seu pensamento. E assim se afastam do cerne das questões basilares com fogos de artíficios, palavras gastas e vazias de pensamento.
Na procura incessante de um "eu" no mundo, parece ser inevitável sufocarmo-nos num coletivo repleto de areias movediças.
Remodele-se este tempo por favor.
Escrevo este texto sem saber, até ao momento, os factos exatos (provavelmente nunca saberemos) do que se passou numa sala de aula de TIC no Agrupamento de Escolas Rainha Dona Leonor, mas caí no erro (não sei se um erro) de ler os inúmeros comentários de outros professores, colegas meus de carreira, que quase o intitulavam de um herói utilizando expressões coniventes com a violência verbalizada nas manchetes dos jornais.
Nota geral: Sendo verdade a violência verbal e física retratada nos media por parte do professor é absolutamente inadmissível que tal tenha acontecido. É absolutamente inadmissível punir em praça pública sem conhecimento de todo o contexto, assim como é absolutamente inadmissível a agressão por parte de alunos para com professores, bem como constantes oposições à autoridade de um professor dentro de uma sala de aula. Isto não é uma opinião, isto é um facto.
Assistimos e vamos tendo conhecimento, quase quotidianamente, de agressões verbais e, inclusivamente físicas, à classe docente por parte dos alunos e embora condenemos de imediato estes atos, parece existir uma certa condescendência latente que se refletem nas expressões: “mais do mesmo”; “são os alunos que temos”, “é o país que temos”. No dia em que um professor, por não sabemos ainda bem o quê, se humanizou, não conseguindo controlar os seus impulsos perante algo que terá à partida sido interpretado como um questionar da autoridade foi o escândalo social. Vejamos, é um escândalo sim, os professores são os adultos e são a referência, devem ser a referência, mas é igualmente escandaloso e retrato de uma sociedade doente, existir a violência inversa. Não pode, não deve, haver condescendência unilateral.
Algo vai muito mal “no reino de Portugal” quando o apelo à violência vem de todos os lados. Alunos contra professores, professores contra alunos, professores contra o resto da sociedade, pais contra professores e professores contra pais. É apenas contra a violência que se deve estar contra. Venha de onde vier.
O que se torna mais preocupante num “reino” como este é o terreno fértil para a entrada de fundamentalismos igualmente inadmissíveis por fecharmos os olhos e assobiarmos para o lado. Quando o Chega chegou ao Parlamento é porque já se infiltrou em todas as áreas. Não, no tempo do Salazar não era bom, mas este tempo também não o está a ser.
Tudo começa a ser preocupante e a pergunta que devemos fazer é como chegámos até aqui? Qual a metáfora do arquiduque Franz Ferdinand que fará despoletar o gatilho para que se acabe de vez com uma cultura de despenalização e desculpabilização de atos que não podem, em nenhum momento, numa sociedade atual ser livre de consequências?
Lembram-se do filme Joker? Vejam e revejam. Está tudo lá.