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De bestial a besta

por Maria Joana Almeida, em 11.08.18

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Estava no 9ºano e a minha professora de inglês pediu-me para ler um texto do livro em voz alta. Fui confiante e apliquei o meu melhor sotaque. Comecei muito bem. Quase a chegar ao final do texto errei na leitura de uma palavra, a professora imediatamente me chamou a atenção. Retorqui verbalizando que tinha sido apenas ali, em todo o texto, que tinha errado, ao qual a professora respondeu numa expressão 50% séria, 50% divertida, “Joana, o erro é a morte do artista”.

 

Entre as várias memórias que guardei dos meus tempos de jovem estudante, recordo-me que esta me marcou profundamente, não de uma forma negativa, mas curiosa por ter achado que a chamada de atenção havia sido exagerada. Exagerada apenas nesta condição: gostaria, no fundo, de ter sentido apreço pela boa performance e depois aquela observação.

 

O “erro é a morte do artista” tem, atualmente, várias leituras e vários palcos. É, recorrentemente dúbio. Serve, em determinados contextos, para construir ou destruir.

 

Aprendi, por experiência própria, a importância do elogio e também a importância da crítica (ler crítica construtiva e não gratuita, a essa já lá vamos). É o equilíbrio entre ambas que nos faz evoluir. Esperar o momento certo e as palavras certas para um e para outro é a arte. Porque às vezes é preciso destruir um bocadinho, uma destruição controlada e reversível, para que possamos construir de novo e melhor.

 

Como professora (e em todas as áreas da minha vida) sei e acredito que reverter o elogio para primeiro lugar e somente para depois a crítica pode fazer milagres. Não que esta ordem tenha de ser de agenda, (por vezes é o reverso que resulta) mas verbalizar somente aspetos negativos de um aluno esgota o espaço para que possa crescer saudavelmente. E na vida, enquanto alunos de qualquer coisa, sabemos que o elogio público e a crítica em privado é o que define um mestre e bom aprendiz.

 

Dizer que os tempos atuais ganharam uma nova dimensão no acesso gratuito e público à crítica tornou-se já do espetro da verdade de la Palice. Constrói-se e destrói-se em segundos. A ética, a moral, os telhados de vidro deram lugar à facilidade em dar voz à nossa esfera mais negra de fúria e frustração. De repente, num determinado tempo deste mundo, podemos ser todos juízes, polícias, jornalistas, comentadores sem ser necessário ter um backround, apenas acesso à internet. Somos bestiais e bestas no mesmo dia.

 

Sem conhecermos todos os detalhes, julgamos no imediato, simplesmente porque podemos. E porque advêm daí um certo poder evangelizador e purista que se esqueceu da velha máxima “atire a primeira pedra quem nunca pecou”. Esquecemo-nos de refletir, de procurar a verdade, de nós próprios enquanto seres humanos. Esquecemo-nos de, na dúvida, perguntar em privado ao invés de destruir publicamente. E aquilo que poderia ser uma forma de construção e auxílio no equilíbrio social, transparente, tornou-se, em inúmeras situações, numa nova inquisição como um mercado livre sem regulação possível.

 

E querendo usar uma imagem atual, em forma de ironia e sem qualquer ideologia politica associada,  #nãosomostodosRobles  #sóquesomos.

 

 

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publicado às 01:07


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