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A minha visão sobre Educação. As várias visões sobre Educação e todas as suas (e nossas) variáveis.
(Vou chama-la de Alice. É um nome fictício, mas é uma pessoa real)
Alice está na casa dos 60, é cabo verdiana e é minha formanda no curso de alfabetização. Está a aprender a ler e a escrever, o seu grande sonho que ficou desde logo registado na primeira entrevista.
Alice iniciou esta formação há sensivelmente ano e meio. Não sabia pegar corretamente num lápis, não conhecia nenhuma letra, não tinha a competência óculo manual desenvolvida para passar para o caderno o que estava no quadro. Tinha a letra grande e tosca.
Alice acordava (e acorda) todos os dias às 04h da manhã para ir trabalhar, faz limpezas numa empresa. Às 09h30 em ponto está na formação para, como diz, “não perder o comboio”. Sai da formação às 12h30 e volta ao trabalho para regressar a casa pelas 20h. Não há uma queixa, não há uma palavra brusca. Há um constante sorriso e vontade de aprender.
Alice não ia às compras porque tinha medo de ser enganada, era ajudada pela irmã e pelos filhos. Não sabia lidar com o dinheiro. Quando recebia uma carta em casa, não sabia para quem era, não reconhecia nomes, tinha de pedir ajuda.
Passado sensivelmente um ano e meio Alice tem uma letra bonita, esforçada. Lê, escreve, faz contas. Alice reconhece nomes nas cartas; sabe o valor do dinheiro, conhece todas as letras, compreendeu o mecanismo da leitura e até já lê casos especiais de leitura. Tem o seu ritmo, que é respeitado, e que a levou até aqui. Ao sonho.
Eu e Alice temos uma boa relação, que vai para além, como deve ir quando queremos criar o espaço para alcançar sonhos, da professora – aluna. Há um enorme respeito mútuo e um carinho muito grande.
Alice sabe que vou ser mãe de uma menina. Sabe que se vai chamar Maria Luísa. Um destes dia pediu-me para escrever o nome dela num papel. “Maria” sabia, mas Luísa estava na dúvida e não se queria enganar.
Esta semana ofereceu-me uma caixa de madeira, feita à mão, “de uma senhora muito habilidosa que faz. Ofereci uma à minha sobrinha e quero oferecer-lhe esta a si. À minha professora”.
E é isto, O afeto é de facto revolucionário.