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Cinco perguntas, cinco respostas com David Rodrigues

por Maria Joana Almeida, em 28.09.17

 

david.png

 

O professor David Rodrigues dispensa apresentações. Já nos cruzámos várias vezes em conferências e colóquios onde as suas reflexões conseguem sempre levar para casa a vontade de fazer mais e melhor, aliás, a certeza de que podemos fazer mais e melhor.

 

Atual Conselheiro Nacional de Educação e Presidente da Associação Nacional de Docentes de Educação Especial entre outras atividades e projetos, David Rodrigues apresenta sempre uma atitude positiva perante as políticas educativas com uma visão clara e fundamentada do caminho que ainda existe para percorrer.

 

È uma honra poder assinalar a comemoração do segundo ano deste blog com uma reflexão de quem todos os dias pensa e trabalha, com grande sentido crítico, sobre e para a Educação Inclusiva.

 

 

 

 

1 – O professor David Rodrigues é, atualmente, uma referência a nível nacional e internacional no mundo da Educação, mais concretamente na Educação Especial. Que vivências o moveram para os importantes contributos que tem dado a esta área?

 

Deixe-me dizer que não tive nenhuma epifania… O meu interesse pelas pessoas com deficiência – sobretudo as mais jovens – foi-se cimentando ao longo da relação que estabeleci com elas.  Uma questão que me lembro sempre de ter estado presente nas minhas reflexões foi o esforço para me colocar no seu lugar. Como seria a minha vida se não andasse? Se não me fizesse ouvir? Se não visse?  Acho que este pensamento, digamos de empatia, sobre as pessoas com deficiência, levou-me rapidamente à defesa dos seus direitos e daqui à advocacia da sua inclusão.

 

 

2 – A área da Educação Especial tem vindo a sofrer evoluções ao longo dos tempos num percurso que se quer e se avizinha cada vez mais inclusivo na nossa sociedade atual. Como encara o modus operandi desta área nas escolas?

 

Esta evolução para escolas que tenham práticas efetivamente inclusivas é um caminho necessariamente longo e contraditório.  Não podemos esquecer que a escola – aquela instituição a que naturalmente chamamos “escola” – é fruto de uma construção de centenas de anos.  A escola construiu-se para transmitir, para receber o conhecimento ao mesmo tempo e no mesmo ritmo que os outros e também para selecionar os melhores.  Ora hoje as necessidades a que a escola tem de responder são completamente diferentes: a escola quer construir e criar conhecimento, quer personalizar os sistemas de aprendizagem e quer que todos tenham sucesso.  Como se vê é uma viragem de 180º na filosofia da escola.  Assim é natural que seja custosa e demorada. Parafraseando Gil Vicente: “todo o mundo” quer mudança mas “ninguém” quer mudar.  Quer dizer: a vontade de mudar é maior do que a operacionalização destas mudanças.

 

 

3 – Foi dado a conhecer recentemente a proposta de alteração ao Decreto-lei n.º 3/2008, de 7 de Janeiro. Um documento que está em discussão pública até 30 de Setembro e que vem recentrar o conceito Inclusão. Quais considera serem os pontos fortes desta nova perspetiva sobre a Educação Especial?

 

O ponto certamente mais forte tem a ver com o facto do projeto de diploma apontar para uma ideia claramente inclusiva. Deixa de se falar em categorização e em necessidades educativas especiais e considera-se que é responsabilidade de toda a escola educar todos os alunos recrutando os meios necessários para que todos aprendam. De certa forma há um inconformismo neste projeto com o insucesso e com o abandono escolar.  Recentemente num documento produzido pela UNESCO escreve-se “Todos os alunos contam e contam igualmente”.  É certamente essa a parte forte e inovadora deste documento.

 

 

4 – O Professor de Educação Especial é uma figura de referência dentro das escolas ainda que, em muitos casos, tenha uma multiplicidade de papéis onde se confundem as suas funções e o seu papel. No seu ponto de vista, qual deve ser o trabalho e principalmente o perfil de um professor de Educação Especial?

 

Precisamos de continuar a discutir o papel do Professor de Educação Especial numa escola inclusiva.  Será certamente um perfil multifacetado em que ao lado da intervenção direta se veja a consultoria, o apoio à diversificação de métodos, estratégias e avaliação do currículo, apoio às famílias, etc.   O professor de Educação Especial é um elemento fundamental para a promoção da inclusão porque permite articular o trabalho dos diferentes técnicos, dos diferentes professores e das famílias com a escola.  A Pró – Inclusão tem intenção de desenvolver em 2018 um trabalho sobre este assunto do perfil profissional.

 

 

5 – Abordando a Educação de uma forma geral e cruzando com estudos recentes que indicam, por exemplo, as grandes dificuldades na área da aprendizagem da leitura e da escrita no 1ºciclo; as famílias que não conseguem apoiar os seus filhos; a falta de recursos apontadas por muitas escolas e professores, que caminho tem a escola ainda que percorrer nas políticas educativas que permitam ultrapassar estas dificuldades?

 

A escola já andou muito caminho. O desafio de uma escola para todos é ciclópico.  Lembro-lhe que quando eu terminei o meu 4º ano só eu fui, entre todos os meus colegas fui, na altura, para o liceu.  Consistentemente temos tido melhorias no nosso sistema educativo o que é verificado não só pela nossa avaliação mas também por avaliações internacionais. O que nos falta?  Não lhe sei responder categoricamente a esta pergunta. Nuns lugares faltarão umas coisas e noutros outras.  O que sabemos hoje é que a organização e a cultura da escola têm uma enorme importância.  A formação e o apoio aos professores são também fatores determinantes e ainda que o desenvolvimento da sociedade tem efeitos claros na melhoria da escola.  Eu diria aos alunos, aos professores, às direções dos agrupamentos, às famílias, às autarquias que cada um de nós tem de fazer a sua parte. Com brio, com competência, com generosidade e espírito positivo.  As pessoas que só culpam os outros desistiram de se mudar e mudar a realidade em que vivem. Precisamos de contar com pessoas que assumam o risco de mudar e de inovar. A inclusão depende muito disto.

 

 

 

 

Nota Biográfica: DAVID RODRIGUES é Presidente da Pró-Inclusão / Associação Nacional de Docentes de Educação Especial, diretor da Revista “Educação Inclusiva” e membro do Centro de Investigação do IE/UL. Professor de Educação Especial doutorou-se em 1987 e obteve o título de agregado em 1999. Lecionou na Universidade de Lisboa e noutras universidades portuguesas (Porto, Lisboa, Açores e Coimbra) e estrangeiras (KU Leuven – Bélgica, VSU – EUA e UNICAMP - Brasil). Trabalhou em projetos internacionais para a UNESCO, UNICEF e Handicap Internacional e OCDE. É conferencista convidado em Espanha, Reino Unido, França, Brasil, Estados Unidos, Colômbia, Cabo Verde, México e EAU – Dubai. Publicou 30 livros e dezenas de artigos em revistas da especialidade. Recebeu em 2007 o Prémio de Investigação “União Latina” e em 2017 foi agraciado com o “Distinguished International Leader Award” pelo Council for Exceptional Children – DISES (EUA).É desde junho de 2015 Conselheiro Nacional de Educação.

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publicado às 18:00

De volta.

por Maria Joana Almeida, em 04.09.17

 

teacher.jpg

 

De volta a mais um ano letivo e ao segundo ano da existência deste blog, são vários os temas que têm invadido os fóruns e redes sociais nos últimos dias com bastante potencial para serem lidos, revistos e esmiuçados. Desde a polémica instalada sobre os livros da Porto Editora passando pela publicação das listas de colocação de professores que conseguiu este ano ser mais atempada do que nos últimos anos.

 

Poderia querer pegar nestes temas mas não o farei. Já muito se escreveu e refletiu, entre vários argumentos, sobre discriminação de géneros e sobre colocações ou não de professores. Nada do que poderia escrever iria acrescentar algo de diferente à discussão.

 

Quero iniciar este ano letivo refletindo sobre um vídeo que vi recentemente intitulado “What if you treated teachers the same way we treated professional  athletes” (E se tratássemos os professores como tratamos atletas profissionais)

 

professional.jpg

 LInk do video: https://www.youtube.com/watch?v=IoUdnoLmQiM

 

 

Assemelhar professores a atletas é um lugar comum (sem deixar de ser verdadeiro) quer pela sua capacidade de adaptação, de persistência, de antecipação e de trabalho. São de facto, na sua maioria. O que este vídeo nos mostra de diferente é a visualização, humorada, de como seria uma escola se tratássemos os professores como se fossem (por exemplo) o Cristiano Ronaldo. Como se fossem os nossos ídolos.

 

Se pensarmos bem, fora estereótipos e preconceitos criados em torno da escola e professores, o trabalho realizado por um professor requer muito treino que se traduz em muito trabalho de investigação. Investigação sobre a sua profissão e investigação sobre os seus alunos  - quem são, como são, porque agem assim, o que posso fazer para corresponder aos seus perfis. Requer resiliência: o futuro é na maior partes das vezes incerto, saltar de escola em escola, adaptar-se de novo, lidar continuamente com a apelidos por vezes pouco abonatórios, ter de construir novos materiais e responder à mesmo burocracia que é todos os anos exigida, ter de engolir em seco provocações, manter a calma e discernimento suficiente para encontrar um equilíbrio. Requer força de vontade para que apesar de todos os contratempos, e às vezes vontade de desistir, não se encostar aos serviços mínimos e lidar ao mesmo tempo (muitas vezes) sem reconhecimento do seu trabalho.

 

Para mim, um professor é especialmente um ídolo e um exemplo a seguir, quando assume uma atitude ponderada mas firme, quando prepara os seus alunos não só com os conteúdos e conhecimentos da área que leciona mas para viver em comunidade sempre através da suas atitudes e não tanto pelas suas palavras. É ídolo quando (rebuscando um pouco dos temas atuais)  mostra que a todos é possível escolher e optar. Que existe liberdade e que o conhecimento traz-nos liberdade. Que homens e mulheres não se distinguem pelo género naquilo que podem escolher e alcançar. Que existe o bom e o lixo na nossa sociedade e que é importante que o saibamos distinguir. Que apesar das diversidades não pode ser opção não tentarmos. E que acima de tudo o sucesso requer treino, esforço, resiliência e força de vontade.

 

 

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publicado às 21:26


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